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Existem fortes indícios de que a pandemia está sendo vencida, mas precisamos continuar cuidando da nossa saúde e dos que nos cercam
Venho comparando a evolução da Covid-19 com a de outras pandemias que atingiram a humanidade, especialmente com a da gripe espanhola e a da gripe de Hong Kong.
A gripe espanhola foi uma catástrofe, pois na época não se dispunham de respiradouros, anti-inflamatórios potentes, anticoagulantes, antibióticos e outras tecnologias capazes de combater as consequências mais graves da virose. As pessoas acometidas tiveram que contar somente com a eficiência de seu sistema imunológico. Foi uma mortandade, principalmente (como agora) entre idosos e pessoas com comorbidades, aliada a péssimas condições de vida, pois a Europa saía da I Guerra Mundial. Meu avô me contou bem como foi tudo, pois ele servia ao exército alemão, na época.
A história mostrou que num período em torno de dois anos, a pandemia se acalmou até desaparecer. Não que o vírus tenha sido erradicado, mas que, junto à imunidade coletiva adquirida pelos sobreviventes (não havia vacina na época), surgiram variantes mais benignas do vírus, que se sobrepuseram àquela agressiva, até que a doença grave se converteu em uma gripe comum, sazonal, de menor mortalidade. Esta é a evolução natural de qualquer virose.
É claro que temos que observar como as coisas vão evoluir mas, a meu ver, a história vai se repetindo: após dois anos de infecção por um vírus bastante agressivo, aparece a variante ômicron. E o que isto pode significar para nós?
O que sabemos até agora:
– A ômicron é altamente contagiosa, isto é, se espalha muito rápido
– A ômicron é (bem) menos perigosa. Segundo estudo da HKU Med, descobriu-se que Omicron SARS-CoV-2 tem um contágio mais rápido e com maior intensidade do que a variante Delta, acometendo os brônquios humanos, mas com infecção menos grave no pulmão: ao contrário das variantes agressivas, ela poupa as células pulmonares. Isso quer dizer que, muito provavelmente, ao invés de provocar uma pneumonia grave, ela causa uma bronquite, semelhante à produzida pela gripe comum.
– De acordo com o professor de medicina John Bell, da Universidade de Oxford, na Inglaterra, a variante ômicron não causa “a mesma doença que víamos há um ano”, reforçando dados sobre a natureza mais leve da cepa. De acordo com ele, pacientes internados com a variante têm passado menos tempo nos hospitais.
– A eficácia das vacinas é menor. Isto já era esperado, pois a ômicron sofreu muitas mudanças na estrutura da tal proteína Spike (a responsável pela inflamação que produz a doença) e essas mudanças (mutações) tornaram a Spike menos agressiva. Como qualquer tipo de vacina induz produção de anticorpos específicos para a proteína (o antígeno), é lógico que quanto maior a diferença da nova proteína em relação à original, menor a eficácia da vacina. Esse fato também explica a maior capacidade de contágio da variante.
Resumindo, se você pegar a ômicron, é menos provável que adoeça gravemente, como acontece com as variantes anteriores (que ainda estão por aí). Segundo colegas com os quais converso e que estão na linha de frente, a chance de hospitalização é bem menor, a não ser que ocorra complicações, como uma infecção bacteriana secundária.
Os sintomas em geral são bem semelhantes àqueles do resfriado comum: dor de garganta, coriza e dor de cabeça, tosse e febre. Os colegas com os quais convivo referem que a grande maioria de seus pacientes estão em tratamento domiciliar, se recuperando de maneira rápida e satisfatória. Claro que não devemos nos descuidar, principalmente em relação aos pacientes idosos e principalmente os portadores de comorbidades, fatores de risco para adoecer gravemente.
Nessa altura, é cada vez maior a importância de manter saudável o nosso sistema imunitário, o que deveria ter sido um alerta desde o início da pandemia. Infelizmente a questão “imunologia primária” foi esquecida. Basicamente, para que qualquer infecção aconteça, é preciso atentar ao equilíbrio ou desequilíbrio entre dois fatores primordiais: carga viral x resistência imunitária. Este balanço é que vai contar se a pessoa que teve o contato com o vírus vai desenvolver (ou não) a doença e, se desenvolver, a gravidade da mesma.
A questão é que tudo parece estar a nosso favor: uma variante bem mais branda, vacinação, imunidade coletiva se ampliando rapidamente, medicamentos antivirais, tratamento precoce e isolamento dos doentes, manutenção das normas higiênicas e o fundamental: maior conscientização da população referente à manutenção de um sistema imunológico saudável.
Referências
https://www.med.hku.hk/en/news/press/20211215-omicron-sars-cov-2-infection. HKUMed finds Omicron SARS-CoV-2 can infect faster and better than Delta in human bronchus but with less severe infection in lung
https://www.med.hku.hk/en/news/press/20211212-omicron-avoids-killing-by-blood-serum. HKUMed-CU Medicine joint study finds COVID-19 variant Omicron significantly reduces virus neutralisation ability of BioNTech vaccine